O referendo separatista da Catalunha

Pelo direito de decidir

Espanhóis repercutem o referendo catalão, que ocorre hoje

Por Marcela Gasperini e Marina Xavier

Apesar da forte controvérsia do governo espanhol, uma nova página da histórica luta do território Catalão para conseguir sua independência frente à Espanha está a prestes a ocorrer. Marcado para este domingo, um novo referendo na região da Catalunha quer analisar a vontade dos cidadãos sobre a criação de um Estado independente.

De acordo com o professor da Universidade Pompeu Fabra, localizada em Barcelona, Ferran Requejo, o governo espanhol tem se oposto frontalmente a autorizar a realização do referendo proposto pelo governo e parlamento catalão. Porém, Requejo também afirma que o governo catalão sustenta que continuará com a organização do referendo. “A legitimidade de sua posição baseia-se em ter obtido a maioria absoluta nas eleições do Parlamento da Catalunha, 72 deputados a favor entre 135”.

Responsável por quase um quinto do produto interno da Espanha, a região Catalã é situada a noroeste do país e que atualmente abriga 7,5 milhões de habitantes, nunca foi um país independente, mas detém há muito um governo próprio, conhecido como Generalitat. A região fazia parte do reino de Aragão, que após a unificação com Castela, em 1942, deu origem a Espanha atual.

Com uma língua própria e culturalmente independente do restante do país, apesar da obrigatoriedade do idioma espanhol nas escolas, o catalão pode ser considerado a língua oficial da região, uma vez que é falado pela maioria da população. Também possuem a bandeira própria da Catalunha, dispensando de vez o patriotismo espanhol.

São essas evidentes diferenças que fizeram com que o sentimento nacionalista crescesse ao longo do século XIX e chegasse ao auge no atual século XX. Apesar de nunca ter sido uma região independente, durante os anos 30, o território catalão conseguiu certa autonomia política e governava seu espaço de acordo com as próprias regras internas.

Em 1936, data próxima à mundialmente conhecida Guerra Civil Espanhola, o general Francisco Franco toma o poder e instala a ditadura que reprimiu severamente o território da capital Barcelona. O poder agora era totalmente centrado em Madrid e o idioma local fora proibido. Foi apenas com sua morte, após 40 anos de governo, que se restaurou a democracia, e de imediato começaram-se os problemas da requisitada autonomia Catalã.

Enquanto 57,2% dos catalães a favor da separação segundo o site La Vaguardia, do jornal catalão do mesmo nome, o plebiscito anterior, realizado em 2014, mostrou que 80% da população apoiava a medida separatista. É o caso da professora e educadora social catalã, Sandra Roig Montane, 36, que se diz a favor da medida devido à repressão que a Catalunha teria sofrido pelo governo federal da Espanha. “Por toda a repressão, opressão e por ter um governo de direita, o qual castiga a Catalunha e não respeita a sua autonomia, singularidade e direitos”.

Quando perguntada sobre as recentes manifestações que ocorreram em apoio ao referendo ela enfatiza: “As manifestações que nós catalães fazemos são reivindicações do nosso direito a decidir, e é por isso que todo 11 de setembro (Dia Nacional da Catalunha), as pessoas saem às ruas para reivindicar os seus direitos de liberar-se da Espanha, e poder exercitar o seu direito ao voto e decidir também o seu futuro como país”.

Para o designer gráfico catalão Andreu Roig Montane, de 41 anos, a economia tem grande influência em sua luta pela independência da Catalunha. “Creio que a riqueza deve ficar onde é gerada. Os impostos que pagamos aqui devem ser utilizados em prol da Catalunha e não de toda a Espanha”. Montane defende que o referendo do próximo domingo aconteça pelo direito que os cidadãos têm de escolher seu futuro, mas teme ser impedido de votar.

Apesar da maioria esmagadora que compartilham do ideal de Sandra e Andreu, inclusive muitos jovens e estudantes, há aqueles que acreditam no retrocesso que a eventual separação traria para a Espanha, uma vez que perderia seu principal polo turístico e industrial, como também para a própria Catalunha, que não mais participaria do bloco da União Européia, cuja opinião é contrária à medida atualmente.

A professora de espanhol, Rosana Rosell Prieto, de 53 anos, nascida em Madrid, é contra a separação Catalã. Para ela, apesar de ser a região mais rica do país, a Catalunha, tornando-se independente teria que negociar com a União Europeia, algo não viável em sua opinião. “Além de fazer a Espanha perder muita riqueza, a independência da Catalunha traria instabilidade para outras regiões que também gostariam de ser independentes, como Valência e Galícia”.

Entretanto, apesar da Comissão Europeia declarar que respeita a ordem constitucional da Espanha, a região autônoma é a mais rica do país, com um PIB (Produto Interno Bruto) de mais de 200 bilhões de euros. Caso a separação ocorra, Espanha e Catalunha precisarão encontrar um meio de coexistir, e os altos índices econômicos da região poderiam facilitar uma futura adesão à União Europeia.

Por ser uma questão antiga, o sentimento da separação Catalã já passou por mais de uma geração, mas para Sandra, nem por isso as gerações pensam diferentes umas das outras. “Eu acho que é um sentimento social que não se prende em gerações. Nós temos uma identidade e uma luta muito antiga pela Liberdade e contra a opressão”. Já para Montane, pode haver uma diferença entre os pensamentos: “os mais velhos viveram, em sua maioria, a ditadura de Franco e estão convencidos da necessidade da independência, já entre os mais jovens, essa opinião é, muitas vezes, mais dividida”.

Para quem olha de fora, se um dia vier realmente a ocorrer a independência da Catalunha, o que vai acontecer depois disso é uma incógnita. Mas para eles, não. Andreu sabe muito bem como vai ser sua vida quando morar em um país independente conquistado pelo povo. “Eu e minha família vamos ter uma melhor qualidade de vida em infraestrutura e sanidade, já que tudo será revertido para o nosso próprio bem estar”.

A educadora Sandra não sabe muito bem como será uma Catalunha independente, mas tem certeza de que haverá um consenso entre população e governadores para fazer o melhor. “Os políticos estão cooperando com os cidadãos em assembleias para decidir o futuro do nosso país. É importante fazer um processo de independência democrático, popular e participativo”.

O professor Requejo explica um pouco melhor o que aconteceria se de fato a Catalunha se separasse da Espanha: “em caso de independência, a Catalunha se tornaria após, ao que tudo parece, um breve estágio de transição, um Estado economicamente solvente e politicamente estável”. Requejo também pontua as consequências que esse processo traria ao território espanhol: “A Espanha é dependente do poder econômico da Catalunha e, especialmente suas regiões mais subsidiadas (sul da Espanha) notariam um prejuízo muito claro, uma situação que as instituições catalãs já ofereceram para negociar”.

Independentemente das consequências que o separatismo catalão traz a toda sociedade espanhola, esse é um desejo muito objetivo e fortemente vivido nos dia a dia dos cidadãos locais. Qualquer pessoa, porém, que visite alguma região pertencente à Catalunha percebe esse anseio nos primeiros contatos com as pessoas ou com as ruas repletas de bandeiras e faixas suplicando pela independência.

Clauci Gasperini tem 42 anos, é brasileira, vive em Barcelona há 12 anos, é casada com um catalão e tem dois filhos catalães. Ela conta sua experiência como estrangeira nessa região tão forte culturalmente. “Desde o primeiro momento nesta cidade, conheci a história de sua cultura, suas necessidades e desejos. O povo catalão é muito trabalhador, educado e pacífico. Em princípio podem parecer distantes e pouco amigáveis, mas tudo vem abaixo quando você realmente faz parte de sua vida”. Para Clauci, a independência da Catalunha é importante simples e puramente pelos direitos de sua população. “Acredito que esses cidadãos, aos quais me incluo nos dias de hoje, deveriam simplesmente ter o direito de poder decidir o melhor para o futuro de sua gente”.

 

Análise

Por quê a Catalunha quer se tornar independente?

Por Beatriz Rubio, Maria Fernanda Mantovani e Priscila Cavallaro

 

A Catalunha, com um pouco mais de 32 mil km², possui cerca de 7,5 milhão de habitantes. Seu presidente atual é Carlos Carlos Puigdemont, do Partido Democrático Europeu Catalão (PDeCAT), que junto com o parlamento, que conta com uma maioria esmagadora, apoia o movimento separatista.

Os catalães querem a independência para que exista uma chance de reforçarem e fortalecerem sua identidade, sua economia, sua cultura e seu idioma, já que eles possuem o seu próprio.

Além disso, a região contribui com boa parte da arrecadação financeira espanhola, por isso acreditam que a economia após a separação possa ser positiva.

Com essa possível separação, os catalães pretendem prosperar como Estado e administrar sua identidade cultural própria, pois alegam não se identificar com a cultura espanhola.

Apesar desse despreparo, a vigilância local foi intensificada apenas em locais propensos à lotação tanto por moradores locais quanto por turistas. “As grandes áreas comerciais continuam com a polícia privada contratada, e a polícia local e regional patrulha nos centros e nas proximidades de qualquer anomalia ou pessoas suspeitas. A vida cidadã corre sem alteração”, relata o ex policial.

Não apenas o policiamento intenso em possíveis áreas de risco mostrou o quanto a cidade estava de certa forma preparada para um pós atentado, os turistas que foram vítimas do ataque receberam assistência médica e psicológica, além da ajuda de tradutores para auxiliar na comunicação com os médicos da região. As autoridades fizeram contato permanente tanto com as vítimas, quanto com suas famílias residentes em seus países de origem e seus devidos consulados.

“Uma vez que o perigo é passado, o comportamento normal é observado nas pessoas, e é digno notar que a cidadania se manifestou várias vezes em favor da polícia pelo sucesso de intervenções e da ajuda prestada às vítimas, já que tudo isso foi feito sem hesitação e com  rapidez no momento exigido”, justificou Manuel ao dizer o quanto Barcelona foi solidária com os turistas que estavam presentes na data do atentado.

 

O chefe do governo espanhol, Mariano Rajoy, pediu “cuidado e mimo” aos turistas que visitam o país após o atentado. Segundo o jornal espanhol “El País”, o turismo vinha sendo ameaçado por grupos extremistas radicais na região da Catalunha, que já protestam desde julho contra o turismo em massa. Manifestantes garantem, em cartazes, que a luta de classes e pela independência da Catalunha são mais importantes do que se preparar para receber os turistas em massa novamente.

Mauro Van Erven, 37 anos, trabalha em um hostel em Barcelona há 12 anos. Ele conta que após o atentado, os turistas hospedados no local voltaram correndo. “O clima ficou pesado, o metrô e comércio fechados, tudo cercado. Mas as autoridades agiram rápido e hoje está tudo sob controle”, garante Mauro, natural de São José do Rio Preto.

O brasileiro explica que a avenida La Rambla é um ponto muito movimentado e repleto de estrangeiros em agosto, por ser época de férias na Espanha. “Ele (terrorista) foi no ponto onde tinha mais gente nesta época”, diz Mauro, que afirma que atualmente o turismo na região voltou ao normal, se não ainda mais intenso, bem como o comércio.

De acordo com o dono do hostel, o comércio reabriu no dia seguinte ao atentado, sexta feira. Turistas e moradores voltaram ao calçadão turístico da avenida e dezenas de policiais patrulhavam a região da Praça da Catalunha mas a circulação de veículos permanecia interditada. Mauro lembra que os portões do famoso mercado turístico La Boquería continuavam trancados e só abriram suas portas novamente três dias depois.

Quanto ao turismo, o aeroporto de Barcelona, El Prat, registrou 4.943.928 passageiros no mês de agosto, 5,2% a mais que no mesmo mês do ano passado, apesar do ataque terrorista do dia 17. Desses, a maioria é de países não pertencentes à União Europeia. As rotas para a União Europeia foram as que mais cresceram no último ano, 10,7% e os movimentos nacionais aumentaram 3.8%. De acordo com o jornal catalão La Vanguardia, o transporte de mercadoria também teve um aumento de 31% em relação ao mesmo mês do ano anterior, bem como todos os aeroportos da Espanha, que tiveram aumento significativo de passageiros de agosto para setembro.
Ou seja, o ataque terrorista praticamente não trouxe consequências para o turismo e o comércio da região, que são grande parte dos pilares econômicos da cidade, que mesmo não preparada para acontecimentos desse trágicos nível, soube enfrentar a situação de cabeça erguida, proporcionando a seus habitantes toda a segurança e apoio necessários. O turismo espanhol continua atingindo grandes números e independente da situação de risco que ocorreu, o comércio e a economia de Barcelona continuam estáveis.

El piromusical de la Mercè é o encerramento da maior festa de Barcelona. Em um show emocionante de fogo, água e música, a edição do dia 25 de setembro homenageou as vítimas do ataque a La Rambla. Um minuto e de silêncio e a música Imagine, de John Lennon foram a trilha sonora escolhida para a homenagem.

 

Turismofobia em Barcelona

 

Moradores locais são os mais afetados pelo problema

 

Por Henrique Toth e Vinicius Enrique, São Paulo

 

Uma forte onda de protestos contra o turismo atinge muitas partes da Europa, mas a Espanha é o país que mais sofre com esse aspecto. A cidade de Barcelona, atração para milhares de estrangeiros, vem sendo o foco principal da chamada “Turismofobia”.

 

Grupos separatistas de esquerda argumentam que há uma forte saturação turística na Espanha, principalmente na cidade catalã. O governo explica que o turismo é extremamente importante para a economia do país. O grande problema é que essas manifestações parecem proliferar em outras partes da Espanha. Veja na matéria a seguir o porquê desses protestos estarem acontecendo na região, qual a posição do governo, e o que pensam os brasileiros que vivem no país.

 

Parece estranho ler que um país está recebendo protestos por conta do excesso de turistas. No Brasil, por exemplo, o aumento de estrangeiros vindo para cá por lazer é comemorado por todos, desde o comerciante na rua até o presidente. Em determinados lugares da Espanha, porém, é diferente. E existem diversos motivos para isso.

 

Em cidades como Ibiza, Barcelona, Palma de Mallorca e outras localizadas no arquipélago balear, o modelo de turismo parece começar a ficar insustentável. O motivo para isso é que a enorme quantidade de pessoas que chegam todo verão começa a elevar o preço de tudo, diminuir a qualidade de vida e afastar os moradores nativos da região.

 

Mas porque os turistas expulsam os nativos? Quanto mais eles chegam, mais os preços do mercado e de moradia vão aumentando. Ou seja, um apartamento alugado que antes custava 100 euros pode estar valendo agora 500, sendo que nada mudou nele. É o que conta Ricardo Carisio, brasileiro que mora em Barcelona desde 2005..

 

“Os moradores – aqui se diz vizinhos – dos bairros centrais, sobretudo onde estão localizadas atrações turísticas, estão, ‘a poic i poic’ (pouco a pouco) sendo obrigados a deixar os apartamentos onde vivem porque os proprietários aumentam os preços dos aluguéis. Habilitam o ‘piso’ e alugam através de plataformas virtuais de baixo custo. Estes bairros passam a ser da moda. Não só em Barcelona está passando, em outros países da Europa”, comenta Ricardo.

 

Além desta questão econômica, existe também a cultural, dos costumes. A grande quantidade de turistas também muda o dia a dia da população nativa, que não era acostumada com festas, baladas e sujeira na rua. Há também a questão da infraestrutura, que é paga totalmente pelos moradores. Elas, porém, ficam paralisadas por conta dos estrangeiros.

 

Todos esses fatores instigaram os moradores a questionarem governo. Afinal, quem está ganhando com esse sucesso turístico? Para onde vão todos os benefícios que vem disso? O que a população ganha com isso? Essas são questões que começaram a aumentar cada vez mais, e estão sendo feitas por um número ainda maior de cidadãos.

 

Cada vez que o turismo aumenta, a renda e o salário dessas regiões vão diminuindo. Esses locais da Espanha tendem a ir para um caminho onde as infraestruturas dos serviços públicos, como saúde, limpeza das ruas, tráfego ficaram insustentáveis.

 

Mesmo sofrendo muitas represálias, a vinda de estrangeiros segue sendo fundamental para os cofres espanhóis. O turismo corresponde à cerca de 11% do PIB do país europeu.

 

Em 2016, a Espanha teve seu recorde de visitantes internacionais.  Mais de 75 milhões de pessoas foram ao país conhecer as atrações turísticas que a região oferece. Um acréscimo de 9,9% em relação ao ano anterior. O grande ponto de concentração do turismo segue sendo Barcelona. Estima-se que 30 milhões de estrangeiros se dirigiram à capital da Catalunha.

 

Com essa forte onda do turismo em Barcelona, grupos separatistas protestam, frequentemente, contra a vinda de estrangeiros para a Catalunha. Carisio conta que tanto a juventude esquerdista como a burguesia se sentem atingidos com esse problema que afeta a cidade espanhola. “No caso específico de Barcelona, também o novo nacionalismo catalão independista, seja a velha burguesia católica ou a nova esquerda republicana radical, sentem-se incomodados e invadidos. ”

 

O governo espanhol se mostra totalmente contrário a essas manifestações que ocorrem no país. Na visão dos governantes, o turismo contribui para o aumento de empregados na Espanha. Cerca de 2,5 milhões de espanhóis conseguem um trabalho dentro do setor turístico, principalmente no verão – mas com condições ruins, como moradia cara e pouca estrutura. E, ainda argumentam, que há uma forte contribuição para o setor de exportação do país.

 

Na contramão do governo espanhol, a prefeita da cidade de Barcelona, Ada Colau, ordenou o congelamento das licenças de construções de hotéis e apartamentos no período de férias. Além disso, declarou guerra contra o aluguel ilegal de apartamentos por meio da internet. O site de aluguel de curto prazo, AirBnb, sofreu uma multa de cerca de 30 mil euros (cerca de R$110 mil). Vale dizer que a gigante empresa californiana lucra duas vezes mais que uma empresa convencional, mas não é fiscalizada pelo Fisco.

 

Com esse fenômeno de aluguéis caros nas grandes cidades, os nativos acabam fugindo dos grandes centros e indo para lugares mais afastados da multidão, a periferia. É o que relata Alysson Maia, brasileiro que vive em Sevilha. “O centro e bairros históricos estão sendo tomados por apartamentos turísticos, expulsando a população para lugares mais afastados e inflacionando os preços dos aluguéis. Isso está acontecendo em várias cidades turísticas, tendo Sevilla como exemplo”, analisa.

 

A turismofobia parece espalhar não só dentro da Espanha, mas em outros lugares do continente europeu. Pegando como exemplo as manifestações dos espanhóis, os italianos, em Veneza, já demonstraram insatisfação com a vinda de milhares de viajantes para a cidade italiana. A intolerância parece só aumentar e, com isso, o problema se agrava cada vez mais.

 

 

A vida depois de um atentado

Após ataque terrorista, a população de Barcelona tenta voltar à rotina

Por Larissa Andreoli e Vanessa Piovezan

 

No dia 17 de agosto, um homem que dirigia uma van branca, avançou para cima de pedestres e atropelou mais de 100 pessoas em La Rampla, Barcelona. O veículo percorreu cerca de 600 metros atingindo as vítimas. Pelo menos 13 pessoas morreram e 130 ficaram feridas. Horas depois houve também um atropelamento em Cambrils, que matou uma espanhola. Foram apreendidos quatro suspeitos, entre eles, três marroquinos e um espanhol. O Estado Islâmico reivindicou a autoria dos ataques. Esse atentado foi o sexto no ano em que os terroristas usaram atropelamento para atacar.

Segundo dados do jornal O Globo, desde 1970, os tipos de ataque têm sido cada vez mais variados. O mais comum é a detonação de bombas, que contabilizam 48% dos atentados, seguidos por assaltos armados (24%), assassinatos (14%) e sequestros (10%). As ações terroristas já fizeram mais 140 mil vítimas no mundo todo.

 

PROTESTOS

Após atentados como esse, a população reage de maneiras diversas. No caso de Barcelona, ocorreu um protesto no dia seguinte, dia 18 de agosto. Os apoiadores da extrema direita culpam os imigrantes pelo atentado e durante a manifestação erguiam cartazes com as frases “Defender a Espanha e a Europa de culturas totalmente alheias à nossa pátria e identidade” e “Parem a islamização da Europa”. Eram em torno de 30 pessoas. Sabendo dessa movimentação, protestantes antifascistas se mobilizaram para fazer uma passeata no mesmo horário e local. A intenção era mostrar que as pessoas contra imigrantes era minoria. Os manifestantes pediam a dissociação entre terrorismo e islamismo. Não houve registros de feridos, mas a tensão e a propagação dessas ideias continuam.

Os encontros para protestar são marcados por meio do Facebook. A página da organização La Falange, de extrema direita, possui mais de 12 mil seguidores e é um site extremamente ativo. “É hora dos patriotas, é hora de defender a Espanha contra aqueles que querem quebrar” é a frase que estampa a descrição da chamada para a próxima manifestação, que ocorrerá no dia um de outubro, cerca de 2 km de onde ocorreu o atentado, na famosa estátua de Rafael Casanova. Além dessa, existem várias outras páginas apoiadoras da extrema direita na rede social em que os seguidores falam abertamente sobre o orgulho de ser patriota militante e como isso é importante para salvar a cidade.

Os grupos antifascistas também são bem significativos na internet e nas ruas. Eles organizam protestos e divulgam material de empatia e cumplicidade com os estrangeiros. A moradora de Barcelona e antifascista, Carmen del Riego, diz que não entende o ódio gratuito. Afinal, Barcelona é vista como uma cidade multicultural e que recebe diariamente novos estrangeiros que visam estudar ou melhorar as condições de vida. Segundo levantamento de dados do Governo catalão de 2015, só de brasileiros eram 5.455 residentes legais na cidade. “É um grupo pequeno de pessoas que cometem atos terroristas, não são todos os muçulmanos e não faz sentido acusá-los”, ela finaliza.

Os dois grupos sempre existiram, porém após o ataque terrorista, ganharam mais voz e adeptos. “Eles têm o total direito de manifestar e exporem suas opiniões, isso é a liberdade de expressão. Porém o foco agora, do governo e da população, deveria ser apenas se recuperar e não acusar”, argumenta o Dr. Tom Smith, palestrante de relações internacionais com especialidade em terrorismo.

 

CONSEQUÊNCIAS ECONÔMICAS

Além de protestos, traumas e mudanças após um ataque terrorista fazem parte da vida não só dos espanhóis, mas de toda a população mundial que já sofreu com isso. Após acontecimentos como o de Barcelona, normalmente a primeira medida é aumentar o policiamento e a segurança da cidade.

Segundo Caio Testa, morador de Barcelona, o clima ainda é de medo, mesmo tendo se passado um mês dos acidentes. “As pessoas estão tentando voltar às suas vidas normais, mas é nítido que estão todos assustados. Ninguém esperava por algo desse tipo”, explica Caio. Ele contou ainda que o policiamento nos pontos turísticos aumentou, assim como os procedimentos de segurança. O país não sofria um ataque terrorista desde 2004, quando militantes islâmicos estouraram bombas em vagões de um metrô em Madri.

Uma das principais consequências de um ataque desse é econômico. Isso acontece porque, o turismo cai drasticamente. As cidades que já sofreram ataques terroristas ao redor do mundo comprovam isso. Um exemplo disso é Paris. Em 2015, a cidade francesa sofreu ataques contra o jornal “Charlie Hebdo” e um supermercado judeu, em janeiro. Mais tarde, no mesmo ano, uma casa de shows chamada Bataclan também foi atacada. O efeito no turismo foi praticamente instantâneo. Segundo o indicador RevPar, que mede a performance financeira de hotéis, o setor registrou uma queda de 19,6% no faturamento. A França liderava o ranking mundial da Organização Mundial de Turismo com garnde condorto, até que se viu perdendo visitantes após essas ondas de ataques terem acontecido. Em 2016, a atratividade do país caiu 2,2 %.

Além do setor hoteleiro, também sofrem todos os aspectos comerciais da cidade. Pontos turísticos, teatros, museus e lojas perdem seu público e, consequentemente, caem de rendimento. A Espanha teve 10,3% de crescimento no número de turistas em 2016, chegando ao ponto de nativos fazerem protestos contra a quantidade excessiva de visitantes. O atentado que aconteceu em agosto prejudicará o país, principalemnte Barcelona, nesse setor. As pessoas tendem a evitar locais com histórico de atentados e lugares com muitas aglomerações.

Apesar de esforços, a recuperação dessa situação é difícil Segundo informações do O Globo, a previsão é de quatro a seis meses. A professora de ciência política da Universidade Webster, Burcu Pinar Alakoc, conta que o abalo econômico é frequente em países que sofrem atentados terroristas. “As dificuldades na economia são resultados, em grande parte, das decisões tomadas pelas autoridades após os ataques.” explica a especialista.

 

 

No tenim por!”*

 

Por Beatriz Rubio, Maria Fernanda Mantovani e Priscila Cavallaro

 

*“Não temos medo”; foi o que milhares de pessoas gritaram no centro de Barcelona após um minuto de silêncio em 17 de agosto, dia seguinte ao atentado na cidade, no qual uma van invadiu intencionalmente à La Rambla, uma das avenidas mais movimentadas no centro que liga a Praça da Catalunha ao Porto Velho, e que atrai muito turistas diariamente. O ataque deixou 13 mortos e 80 feridos. Testemunhas relataram que o acontecimento foi seguido de correria e pânico, além de um bloqueio quase total da cidade.

Segundo a imprensa espanhola, dois suspeitos foram presos e o outro suspeito morreu em uma troca de tiros. O motorista da van fugiu caminhando após o ataque e o veículo usado foi alugado em um município perto de Barcelona por um homem chamado Driss Oukabir.

Aos moradores da cidade, restou o sentimento de solidariedade e dor. Jordi Mor de 68 anos que vive em Barcelona desde sempre e estava em sua casa na sala de estar quando viu a primeira notícia sobre o assunto. Sua primeira reação foi de surpresa total a ponto de não conseguir raciocinar, seguido do sentimento de indignação. Jordi, diz que isso não poderia ter acontecido porque para ele Barcelona é e sempre foi uma “cidade de paz”.

Ao mesmo tempo, é interessante perceber o quanto os cidadãos possuem um sentimento de patriotismo muito grande. Jordi, citou o quanto se sentiu orgulhoso com as forças de segurança e com os médicos que atuaram no momento do atentado e afirma que essas coisas podem acontecer em qualquer lugar, anulando totalmente qualquer culpa do Estado: “Nosso país da Catalunha é pequeno, mas seguro. Na forma como hoje os terroristas agem, ninguém está seguro em qualquer lugar, mas aqui as pessoas são fortes”. O aposentado que, frequenta a La Rambla mais nos feriados, deixou bem claro que continuou a ir no lugar mesmo após o acontecido e que fez questão de não alterar nenhum de seus hábitos, assim como todos os catalães.

 

 

A cidade sempre foi um local repleto de turistas do mundo todo, um ambiente tranquilo para se viver, com uma ótima qualidade de vida. Esse cenário de confiança em sua pátria após o ataque não apaga a normalidade que é a população estar mais insegura e sentir falta de uma polícia local mais treinada para agir em momentos como esse.  Manuel Martí, um ex policial de Barcelona de 77 anos, que agora está aposentado, conta que a cidade não esperava ser alvo de um atentado: “Em Barcelona, tivemos apenas um ataque terrorista de grande magnitude, o ETA que explodiu uma bomba em lojas de departamento da Hipercor há mais de três décadas. A polícia local não tem jurisdição sobre o terrorismo. É uma questão reservada às forças do Estado. A Espanha é um país que continua tão central quanto com os reis católicos…”, alfineta Manuel. Esses são apenas um dos motivos que cercam o interesse polêmico da Catalunha de se tornar um país independente da Espanha: criar uma república, ter uma administração e leis próprias, buscando cada vez mais melhorar a vida de todos, nesse caso, por exemplo em relação à segurança.

 

 

 

 

Standard

Turquia enfrenta período instável

Após referendo, líder turco tem poderes ampliados

Por Giovana Meneguin

Imagem via AFP

Em 16 de abril a Turquia votou “sim” para o referendo constitucional de Recept Tayyip Erdogan. As mudanças na Constituição, propostas pelo referendo, incluem o desaparecimento do posto de primeiro-ministro, fazendo com que fique ao cargo do presidente nomear ou afastar membros do corpo judicial do governo.  O presidente também passa a poder promulgar leis por decreto ou dissolver o Parlamento. Além disso, o Parlamento não fiscaliza mais os ministros e exerce pouca influência em caso de destituição do chefe de Estado, por exemplo.

Consequentemente, o papel do Parlamento turco passa a ser mínimo. Por fim, o presidente passa a ser chefe de Estado e de governo, acumulando, assim, muito mais poder. De acordo com o jornalista turco Abdullah Bozkurt, exilado na Suécia, o referendo representa um retrocesso para a Turquia. “Ele reverteu quase toda a conquista que o país obteve em seu âmbito político e social, além de dar um grande golpe às conquistas econômicas”, ele afirma. O jornalista também completa dizendo que “a Turquia tornou-se um Estado autocrático governado por um ditador”.

Bozkurt

Bozkurt deixou seu país para fugir da prisão. (Foto: arquivo pessoal)

Erdogan foi eleito primeiro-ministro da Turquia pela primeira vez em 2002 e, a partir de então, reelegeu-se ao cargo diversas vezes. Mas, apenas em 2014, que ele assumiu a presidência do país. Na Turquia pré-referendo, a figura do presidente possuía muito menos poder.

“A Turquia tornou-se um Estado autocrático governado por um ditador”. Abdullah Bozkurt

Segundo o Setor Cultural da Embaixada Brasileira em Istambul, os resultados oficiais do referendo “mostram que o partido governista obteve maior apoio no interior do país”. Vale apontar também que, em países da Europa, onde há muitos residentes de origem turca, “a vitória do Presidente Erdogan se deu por margem maior do que na Turquia”, como comenta o Setor Cultural.

Os grandes favoráveis às alterações, o AKP (Partido da Justiça e Desenvolvimento, de Erdogan) e o MHP (Partido do Movimento Nacionalista, extrema-direita) afirmam que agora o país passará a ter uma maior estabilidade política. Entretanto, para a oposição de Erdogan, a Turquia perdeu o chamado checks and balances, ou seja, o equilíbrio e controle entre os poderes do Estado.

Segregação no país

O líder divide o país. A maioria da população turca, islâmica, apoia Recept Erdogan, visto que o presidente trouxe de volta à Turquia os valores do islamismo. Tais valores foram evitados durante a chamada ocidentalização do país, que teve início após a Primeira Guerra Mundial, quando a Turquia foi proclamada uma República. A oposição de Erdogan é representada, principalmente, por conservadores moderados, grupos de esquerda, Curdos, Alevis (grupo muçulmano heterodoxo e progressista, representa 20% dos habitantes turcos) e pelo Movimento Gulen (movimento civil islâmico que prega a liberdade de pensamento e a coexistência pacífica de culturas e religiões).

Recept Erdogan lida com sua oposição de forma bastante repressiva. De acordo com Bozkurt, aos grupos de oposição política são oferecidas “vantagens e posições políticas, dinheiro e poder no governo”. Caso essas estratégias não surtam efeito, membros chaves dos grupos são presos. Já movimentos não políticos, sofrem com abuso de poder.  Bozkurt considera o Gulen um grande exemplo. “O grupo pacifista foi declarado terrorista, mesmo nunca tendo sido associado com nenhum ataque terrorista nos últimos 40 anos, desde que nasceu”, ele explica. Diversas instituições do Gulen foram fechadas nos últimos anos, como escolas, funções e organizações de mídia.

Atualmente, 237 jornalistas estão presos na Turquia. Empresas de mídia são, direta ou indiretamente, controladas pelo atual presidente e seus associados. Dessa forma, não há veículos de imprensa críticos e que apurem fatos e fiscalizem o governo, bem como não há uma mídia independente na Turquia. Em meio a esse cenário, em 2016, Bozkurt deixou seu país, quando o governo passou a fazer vista grossa em profissionais da comunicação. Neste período, a empresa de notícias em que ele trabalhava, Muhabir, foi fechada e seu escritório invadido pela polícia.

A Constituição turca, em vigor atualmente, foi adotada em 1982. Muitas das 18 emendas constitucionais propostas passam a valer somente a partir de 2019, após as eleições parlamentares.

Brasil e Turquia através do tempo

As relações diplomáticas entre os países tiveram início em 1858, quando o Brasil e o então Império Turco-Otomano assinaram o Tratado Bilateral de Amizade e Comércio. De acordo com o Setor Cultural da Embaixada Brasileira em Istambul, “a relação bilateral dos países é muito boa, e ambos compartilham objetivos em diversos foros multilaterais”. Tanto o Brasil quanto a Turquia defendem o fortalecimento de instituições multilaterais como a ONU, o FMI e o G-20 econômico. Os países também demonstram interesse no diálogo franco e construtivo sobre as grandes questões mundiais, como segurança, comércio e cooperação para o desenvolvimento. Além disso, no campo econômico, as relações entre o Brasil e a Turquia também cresceram na última década. Entre 2011 e 2012, o comércio bilateral cresceu 900%, alcançando US$ 2,1 bilhões.

O Setor Cultural também ressalta que o laço entre Brasil e Turquia se estreitaram durante a primeira década do século XXI. Dentre os motivos que levaram à aproximação, está o apoio da Turquia em meio à evacuação de brasileiros no Líbano, em 2006. Além disso, em 2009, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva realizou a primeira visita de um Chefe de Estado brasileiro à Turquia. Durante a visita, negociou-se a Declaração de Teerã, documento assinado em 2010 por Brasil, Turquia e Irã afim de contribuir com a resolução do dossiê nuclear iraniano. Em 2010, o então primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan visitou o Brasil e firmou o Plano de Ação para a Parceria Estratégica. Segundo o Setor Cultural, o documento cria “uma moldura para o aprofundamento do diálogo e da cooperação em campos como política internacional, agricultura, ciência e tecnologia, comércio exterior e energia”.

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Xenofobia, agonia e incerteza: a vida de brasileiros no Reino Unido com o avanço do Brexit

Após aprovação de referendo de separação do Reino Unido da União Europeia, imigrantes lidam com a imprecisão de informações e a insegurança de permanência em território inglês, como o Brasileiro Juninho Fanti, 22, vive no Reino Unido há um ano. “Não tenho intenção de deixar o país”, conta. Foto: arquivo pessoal

Reportagem: Luis Ottoni, Renata Canivezo e Juliana Pithon

“Independente do que acontecer, não pretendo sair do Reino Unido tão cedo”, conta a brasileira Milene Handel, 45. “O importante são as oportunidades. Se a economia afundar, mudaremos para outro país europeu”, garante ela que vive em Londres há dez anos graças aos direitos que a cidadania alemã lhe garante. Assim como Milena, cerca de 120.000 brasileiros escolheram a Inglaterra para construir uma nova vida, segundo dados do Itamaraty. Ocorrido em junho de 2016, o referendo que decidiu pela saída do país da União Europeia (UE), o Brexit, vem abalando o plano de muitos desses aventureiros.

“Quando fiquei sabendo do Brexit, fiquei apreensivo porque não sabemos o que vai acontecer. Dizem que para quem já está e trabalha aqui vai continuar a mesma coisa. Mas não tenho muito medo porque acredito no papel crucial dos imigrantes para a economia do país. Na cafeteria que eu trabalho, por exemplo, de trinta funcionários, apenas três são ingleses”, enfatiza Junior Fanti, 22, que migrou ao Reino Unido em maio do ano passado, seguindo os passos da irmã que vive lá há três anos. Ambos têm cidadania italiana.

Para Edward Koning, professor e doutor em estudos políticos e imigração europeia da University of Guelph, no Canadá, quando o Brexit se concretizar, o governo britânico terá de ter criado medidas de suporte aos cidadãos estrangeiros. “Essas políticas serão necessárias porque uma emigração em massa traria danos às empresas britânicas. E quando se mexe de forma radical com o empresariado em uma democracia, é fato que o governo espere uma punição nas próximas eleições”, afirma.

Ainda de acordo com Koning, o aumento de problemas sociais, causadas pela ascensão de discursos políticos pautados no ódio a imigrantes são consequências a curto prazo que a saída do país do bloco ocasionará ao Reino Unido.

“O sucesso do referendo alimenta o discurso de políticos que colocam a culpa da situação econômica do país no aumento do número de imigrantes e refugiados. Da mesma forma, isso se propaga entre as pessoas e, quanto menos diversidade termos no país, mais as pessoas tendem a pensar que isso é verdade”, frisou.

 

“VOLTE PARA O SEU PAÍS”

Desde a criação da UE, o Reino Unido mantém uma relação complexa com o bloco, permeada por temas como centralização versus controle nacional que sempre foram um ponto sensível.

Um dos principais argumentos pela separação é o de que a economia britânica hoje é mais inventiva e dinâmica que a dos anos 70 e que estas características são prejudicadas pela intensa burocracia de Bruxelas. Apesar de fazer parte do mercado único e livre circulação de bens e pessoas no continente desde 1993, o Reino Unido optou por não adotar o Euro e manteve a sua própria moeda, a Libra Esterlina.

“O Brexit foi aprovado por uma maioria de pessoas que não se sentem representadas por partidos políticos ingleses tradicionais que enaltecem um cenário de crise no país para conseguir votos”, analisa Elitsa Molles, professora doutora em estudos políticos da Boston College, nos EUA. “Com isso, devemos experienciar o desenvolvimento de um cenário mais hostil a imigrantes, especialmente àqueles que podem ser identificados como tal”, afirma Elitsa.

“Uma vez fui a um pub no centro de Londres. Enquanto fumava e mexia no celular, ao lado de fora do lugar, um cara estranho se aproximou e me disse: ‘fica tranquilo, aqui ninguém vai te roubar. É a Inglaterra. Volta para o seu país”, conta Ana Carolina Piussi, 30. Vivendo em Londres há seis anos, Ana afirma ter sentido mudança no acolhimento dos locais. “Mas por enquanto não vejo nenhuma necessidade de mudar de país”, disse.

O mesmo ocorreu com o mineiro João Pedro Antunes, de 25 anos. Antunes conta que quando se mudou para o Reino Unido, não tinha consciência do que o esperava em um dos maiores centros econômicos da Europa. “Logo após o Brexit eu fui alvo de preconceito por colegas de trabalho que nunca imaginei que fossem me tratar mal. Saí de lá porque quis, mas ainda estou desempregado. Agora, sem dúvidas estou sentindo uma maior dificuldade para encontrar outro serviço”, relata.

Para a historiadora Bia Ratton, 24, recifense, estudante de Ciência Política na University of Sussex, residente em Londres, a xenofobia e a aversão aos estrangeiros sempre foi muito frequente no Reino Unido. “Quando fui a uma festa com meu primo, ele foi abordado por diversos garotos. Um deles chegou em nós, mostrou a foto de um terrorista e disse ao meu primo: ‘você parece com ele’”, relata

 

“TOMA LÁ, DÁ CÁ”

Como ainda não há uma política clara estabelecida pelos órgão públicos ingleses em relação à permanência de migrantes que já estejam no Reino Unido, o sentimento de insegurança sobre o futuro leva brasileiros a buscarem assistência especializada.

“A Inglaterra não está para brincadeira”, comentou a brasiliense Joseni Saraiva dos Anjos. Dos seus 53 anos, quase 30 foram vividos em Londres. A brasileira foi para a cidade, em maio de 1987, com a família do Embaixador José Antônio Castello Branco Macedo. Hoje, ela ajuda outros imigrantes com documentação de visto e residência. “Uso dos meus conhecimentos para ajudar o nosso povo”, disse.

Ao considerar os brasileiros muito “toma lá, dá cá”, Joseni afirma que “todos estão muito assustados, o desespero é total, há uma agonia. Os comentários são terríveis, porque eles ainda não têm informações objetivas”. Sua ajuda para os estrangeiros brasileiros e portugueses se baseia em agilizar a residência com os três formulários exigidos pelo governo; um de 37 páginas, outro de 100 e um de 85. “Imagina, todos os dias eu ter que fazer isso, são quatro, cinco ou até dez vezes”, contou.

Apesar do desespero por parte dos não-ingleses, Joseni deu as “good news”. “Eu acredito que logo todos estarão acostumados com a situação, porque o governo não quer prejudicar ninguém”, disse. “Os benefícios não foram tirados, como a saúde. Nada foi mexido. Em todos os lugares que eu vou, a situação continua a mesma”.

Joseni não vê casos de xenofobia na cidade onde mora há tantos anos. Ela afirma conhecer muitos brasileiros e casais os quais ajuda e que, em nenhum momento, soube de alguém ter sofrido ofensa por sua nacionalidade. “É um país que faz o que pode pelo ser humano. Não existe xenofobia. Quando um brasileiro recebe o visto dele, lá está escrito que ele é livre para abrir negócios, trabalhar e ter liberdade”, assegurou.

“Os imigrantes não votaram no Brexit, os ingleses votaram”, ratificou Joseni sobre a votação ocorrida em 2016. “Eles são os donos do país, imagina se nós podemos fazer alguma coisa. Eles estão aqui há quantos milhões de anos, eles existem e têm suas próprias economias”.

 

OUTRO LADO

O inglês John Chapman, 24, é um dos 52% dos cidadãos que votou “sim” no referendo. Natural de Bristol, Chapman considera que “a longo prazo, o Reino Unido estará em melhor posição financeira e, então, pode ajudar de forma eficaz a comunidade internacional”.

Apesar de considerar um problema a ajuda financeira que o Reino Unido tem dado a países da União Europeia, como Portugal e Grécia, o britânico é favorável à imigração dentro do território. “A migração é a ordem natural da sociedade, porque seres humanos são seres sociais que precisam se mover. É bom para a economia e para ampliar a visão de mundo das pessoas”, afirmou.
A preocupação em relação às novas regras de imigração que surgiram após a consolidação da saída do país do bloco é intensa, e o crescimento de manifestações da extrema-direita com discursos anti-imigração, adotados de uma intensa retórica nacionalista e jingoísta, impõe medo em algumas comunidades estrangeiras.

Aos milhares de brasileiros e imigrantes que tentam construir uma vida no país, não há nada a fazer a não ser esperar pelos impactos do referendo.

 

 

 

 

 

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Jornalistas avaliam atuação da Odebrecht na América do Sul

Manchete do jornal peruano La República. Foto: reprodução

Por Evelyn Bianca, Gabriel Fernandes, Mariane Ussier e Marina Prates

A operação Lava Jato começou a ser realizada pela Polícia Federal em março de 2014 e hoje é a maior investigação de corrupção e lavagem de dinheiro no Brasil. Os desvios de recursos da Petrobras estão avaliados em bilhões de dólares. Entre os investigados no Brasil estão figuras importantes no cenário político como o ex-presidente Lula, ex-presidente da câmara Eduardo Cunha, ex-governador do Rio de Janeiro Sergio Cabral, executivos de grandes empresas e entre outros. Com o avanço das investigações a Lava Jato tomou proporções internacionais. Quatorze países investigam ilegalidades em obras da empresa Odebrecht.
Após quase três anos do seu início, a operação Lava-Jato começou avançar em âmbitos internacionais, envolvendo diversos países da América Latina e Estados Unidos, em troca de preferência em obras públicas a operação Lava Jato tem alcançado figuras importantes de países como Peru, Colômbia, Venezuela e Equador. As investigações acusam pessoas públicas de peso de terem sido beneficiadas através de propinas pela empreiteira brasileira Odebrecht.
Por meio de acordos de cooperação internacional, responsáveis do Ministérios Público e da Polícia desses países, vêm trocando informações com investigadores brasileiros para apurar os indícios de práticas corruptas como lavagem de dinheiro, fraude em contratos e doações irregulares de campanha.

Equador
Dentre os países da América Latina, o Equador é o que apresenta investigações menos avançadas em relação aos processos que a empreiteira brasileira vem sofrendo no continente. Isso não quer dizer que o governo do país não esteja se esforçando para investigar as supostas irregularidades: o Estado equatoriano trabalha no caso em parceria com Colômbia e Peru, países com investigações mais avançadas e empenha-se na definição de um acordo para esclarecer supostos subornos de 33,5 milhões de dólares da construtora a funcionários equatorianos.
De acordo com declarações do procurador-geral do Equador, Diego García, ao jornal “El Comércio”, a ideia é chegar a um acordo de cooperação para obter informações detalhadas sobre a suposta rede de subornos e conseguir uma indenização a favor do Estado equatoriano.
Outra solicitação é que a Odebrecht identifique os contratos envolvidos em atividades ilícitas no Equador. “Somente quando forem conhecidos os contratos, o esquema de corrupção utilizado, os montantes entregados e a forma como esse dinheiro foi transferido, será possível determinar quais são as instituições envolvidas e estabelecer o prejuízo causado”, afirmou a Procuradoria em comunicado à imprensa.
Conforme o relatório das investigações aberto pela Procuradoria em dezembro, as autoridades locais estão analisando aproximadamente 30 contratos firmados pela Odebrecht com empresas públicas do Equador e pediu que o Estado fosse proibido de firmar novos acordos com a empresa brasileira, além do bloqueio de pagamentos de 40 milhões de dólares à empreiteira e a apreensão de documentos e equipamentos nos escritórios da companhia no país.
O curioso é que a Odebrecht já atua há 27 anos no Equador, inclusive esteve envolvida em outro caso de irregularidade no país: em 2008 o então presidente Rafael Correa expulsou a empresa por irregularidades na construção de uma hidroelétrica. Entretanto, após um acordo que incluiu o pagamento de indenização a empresa voltou ao país.
Segundo o jornalista Christian Zurita, do “El Universo”, será interessante acompanhar como o novo presidente do país lidará com o caso, já que o país passa por um processo eleitoral. Ainda segundo o jornalista, o presidente Rafael Correa está envolvido nos casos de suborno e trabalhava na tentativa de abafar os casos. “No Equador não sabemos nada de Odebrecht e Lava-Jato, a única coisa que sabemos é que é maior do imaginávamos”, afirmou.
Zurita também detalhou como o caso tem sido tratado no país. “A informação tem sido mínima, a conta gotas, nada é oficial por conta do Correísmo. Junto com a Venezuela, são os únicos beneficiados pela confidencialidade brasileira e seu pouco interesse pelo resto da região. E enquanto a Alianza País manter o poder, dificilmente o povo conhecerá a verdade”, analisou o jornalista.
*Correísmo: Termo criado para os seguidores do presidente Rafael Correa
*Alianza País: Partido Político do Equador

Colômbia
No caso da Colômbia, a relação da empreiteira com o país existe há muitos anos, desde 1992. A Odebrecht realizou projetos como a ferrovia “La Loma Santa Marta” e a hidrelétrica “La Mie”l. Em 2009, a construtora foi responsável por um contrato de mais de um bilhão de dólares. Tal contrato referia-se à construção da Rodovia “Ruta del Sol”, que tem cerca de 528 quilômetros e vai unir a capital de Bogotá à Costa do Caribe, e continua em andamento até hoje sendo uma das mais importantes do país.
Além dessa, a empresa também é responsável por obras como a do Corredor Transversal de Boyacá, que tem aproximadamente 49 quilômetros, a construção da autopista “Ocanã-Gamarra” e a recuperação da navegabilidade do rio Magdalena, que é o principal do país. Sendo o último, avaliado em cerca de 850 milhões de dólares.
Com o avanço das investigações no Brasil e declarações por parte da própria empresa de que propinas haviam sido pagas a outros países, as obras na Colômbia também viraram alvo nas investigações. A justiça colombiana investiga a possibilidade de pagamento de propinas por parte da Odebrecht, para o financiamento da campanha de reeleição de Juan Manuel Santos no ano de 2014, atual presidente da Colômbia.
Em janeiro de 2017, o senador Otto Bula foi preso acusado de embolsar mais de quatro milhões de dólares em propinas, para facilitar a realização da rota Ocanã-Gamarra no país, sem licitação. Segundo as declarações de Bula à justiça colombiana, ele ficou com 10% desse valor e o resto foi repassado ao gerente de campanha do presidente Juan Manuel Santos.
Procurada, a Secretária da Transparência da Colômbia afirma que as acusações do envolvimento do presidente são falsas. Além de Otto Bula, o ex-vice-ministro dos transportes da Colômbia também foi preso. Gabriel García Morales, foi ministro entre os anos 2002 e 2010, e é suspeito de receber cerca de 6,5 milhões de dólares da empreiteira, referente a uma obra de 2009. Morales também foi detido em janeiro de 2017, algumas semanas antes da prisão do senador Bula. Segundo a procuradoria, há evidências de que o ex-ministro teria assegurado de que a Odebrecht seria a única empreiteira hábil a licitar um dos trechos da Rota do Sol.
Apesar de duas figuras importantes do cenário político colombiano estarem presas, a investigação encontra-se em sua fase inicial. O Ministério Público realiza 11 investigações em todo o país, e já contabilizou cerca de 11 milhões de dólares pagos em propinas pela empreiteira entre os anos de 2009 e 2014. As investigações podem tomar proporções ainda mais catastróficas, apesar de a Odebrecht alegar que não, há riscos de que obras da empreiteira brasileira na Colômbia sejam paralisadas. A Secretária de Transparência afirma que, caso haja comprovação e condenação em relação ao suborno, a Odrebrecht ficará proibida de executar obras no país e de participar da disputa por novas licitações por um período de 20 anos. A norma faz parte do estatuto de anticorrupção da Colômbia.
Além disso, a transparência também alega que todos os contratos envolvidos em pagamentos de propinas por parte da empreiteira brasileira serão cancelados. Em janeiro, a Odebrecht assinou um termo de colaboração com as autoridades colombianas. Com isso, a empreiteira se disponibilizou a cooperar com a justiça e a revelar os esquemas de corrupção no país, que envolve obras e figuras públicas. A empresa também se comprometeu a pagar uma multa, a fim de continuar atuando no país.

Venezuela
A maior empreiteira brasileira, Odebrecht, é um dos grandes alvos de investigação da operação Lava Jato, acusada de envolvimento em acordos políticos e pagamento de propinas para obter contratos de obras públicas.
Desde 2001 até final de 2016, a empreiteira teria feito pagamentos de aproximadamente 439 milhões de dólares em diversos países e grande parte envolvendo países da América Latina. A Venezuela foi o país latino-americano em que a Odebrecht fez mais pagamentos, somando um total de 98 milhões de dólares, segundo dados do Departamento de Justiça dos Estados Unidos.
A empreiteira comandava cerca de 40 obras dentro do país, as principais obras incluíam linhas de metrô, construção de siderúrgicas e pontes. Entre os países vizinhos, também estão Argentina, Peru, Colômbia, México e Equador.
Devido grandes repercussões da investigação na Venezuela, o país congelou contas bancárias e os ativos da empreiteira, em resposta ao pedido do Ministério Público do país. Além disso, a comissão da Câmara Venezuelana de Construção suspendeu temporariamente as alianças com a construtora Odebrecht, até que seja tomada uma decisão final pela Assembleia Geral.
Na mídia, a ONG Transparência Venezuela tem atuado de maneira bastante parcial e objetiva sobre as investigações da Lava Jato no país. Os portais de comunicação da ONG são alimentados de conteúdos esclarecedores sobre a operação Lava Jato e suas consequências.
Com o objetivo de fazer um jornalismo transparente, a ONG não admite que o governo de Nicolás Maduro oculte informações básicas sobre os possíveis contratos feitos com a empreiteira brasileira. A falta de investigação feita por autoridades venezuelanas em obras da empreiteira brasileira no país é uma das principais críticas feita ao governo de Maduro.
Durante a cobertura midiática, dois jornalistas brasileiros foram presos na Venezuela enquanto investigavam as denúncias. Gilzon Souza e Leandro Stoliar foram detidos pelo Serviço de Inteligência Venezuelano, em fevereiro desse ano, junto com dois integrantes da ONG Transparência Venezuela.
Em nota, a Associação Brasileira de Radio e Televisão repudiou a ação do governo venezuelano e diz que todo o material coletado pelos repórteres foram apreendidos. Tal ação é vista, por parte da mídia Venezuela, como uma ação ditatorial e de censura ao acesso a informação.

Peru
No Peru, os escândalos de corrupção da empreiteira brasileira tomaram rumos muito maiores do que os outros países vizinhos, o ápice – até o momento – foi em fevereiro, quando foi decretada a prisão do ex-presidente Alejandro Toledo, acusado de receber 20 milhões de dólares durante o seu governo de 2001 a 2006. O último escândalo desse nível aconteceu em 2000, quando o então líder peruano, Alberto Fujimori, foi condenado por execução e financiamento de jornais sensacionalistas que atacavam a oposição, além de também ter sido acusado por desvio de verba pública.
Com apenas alguns meses de vida, a Lava-Jato já está começando afetar a economia e a política do Peru. “A Lava-Jato vai afetar a estabilidade do Peru em médio prazo, a Odebrecht era um dos principais contribuintes do país. O Gasoduto do Sul, por exemplo, já está paralisado”, afirma o jornalista investigativo Oscar Castilla, do jornal local “Ojos Públicos”. Em fevereiro, a maior obra de gasoduto do país foi interrompida por causa do caso Odebrecht. Com mil quilômetros de infraestruturas e um investimento por parte do governo peruano de sete bilhões de dólares, o reflexo são macros, além de deixar 15 mil pessoas sem emprego.
O caso Odebrecht ganhou editorias exclusivas, cobertura jornalística com prioridade, e não só sacudiu o governo peruano e a economia, como também a população do país. “Há muita raiva por parte da população. As pessoas estão realmente interessadas em acompanhar os rumos que as investigações vão tomar. Até manifestações contra os subornos de agentes públicos aconteceram”, conta Castilla sobre a repercussão local.
Os reflexos são inúmeros, no âmbito jurídico do país as acusações de desvio de dinheiro dos cofres públicos foi a “gota d’água” para uma mudança na Constituição do país. O Congresso peruano aprovou em votação unânime no começo de março, um regulamento para a alteração do artigo 41 da Constituição. A mudança no documento máximo da democracia peruana declara imprescritíveis os casos de corrupção graves e recorrentes, e ainda precisará passar por uma segunda votação, que acontecerá em julho. Entretanto, a primeira aprovação já é uma vitória para o país, que normalmente demoraria anos na discussão dessa pauta. Mesmo nos anos 2000, com os escândalos do ex-presidente Fujimori e seu assessor Vladimir Montesinos – protagonista de um vídeo onde entregava dinheiro estatal a congressistas, militares, entre outros -, todos os projetos de lei foram rejeitados.
“Nenhuma força política no Congresso poderia se opor contra um caso que envolve dois ex-presidente, Toledo e Humala”, lembra o jornalista que está apurando exclusivamente a Lava-Jato nos últimos meses. Enquanto o governista Toledo já foi acusado por receber dinheiro da empreiteira em troca de concessão de uma estrada, o ex-presidente Ollanta Humala e sua esposa são alvos de investigação por suposta lavagem de dinheiro. Segundo um ex-diretor da construtora brasileira, Humala, que governou de 2011 a 2016, recebeu caixa dois de três milhões de dólares para sua campanha presidencial.

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Recém aprovado, Acordo de Paris depende dos EUA e é desafio ao Brasil

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Brasil define objetivos que exigirão bastante das empresas. Já nos Estados Unidos, após rebeldia de Trump, especialista afirma que saída do país pode abrir precedente para derrocada. (Foto: divulgação/COP21)

Por Rodrigo Bitar

O Acordo de Paris, fixado em dezembro de 2015, alertou o mundo para a diminuição da emissão dos gases de efeito estufa. A determinação foi assinada por 195 países. Destes, 98 ratificaram-no neste ano antes mesmo da 22ª Conferência das Partes (COP22) em Marrakesh, no Marrocos. Este evento, aliás, só aumentou a importância do compromisso.

A aprovação foi mais rápida do que o esperado. O Protocolo de Kyoto, adotado nos anos 90, demorou oito anos para alcançar a autenticação. Aproveitando a velocidade da ratificação obtida em menos de 12 meses, o Acordo de Paris já espera ter alguns resultados em 2020, ano em que à princípio o projeto começaria a sair do papel.

Mas afinal… qual é a importância desse acordo?

Se a meta for alcançada, o mundo terá um aumento de temperatura entre 1,5oC e 2oC em 2100. Bastante, é verdade, mas considerado reversível por especialistas, que veem 4oC, projeção feita com base nos atuais números de emissão, como um verdadeiro desastre ecológico.

Você deve estar pensando que esse acordo é realmente importante pelo motivo listado, mas o perito ambiental Alex Teixeira amplia a relevância deste. “Apesar da alta quantidade de emissão de gases, muitas pessoas não se dão conta que isso influencia diretamente no nosso dia a dia”. Teixeira explicou que o lançamento esquenta a atmosfera, retendo mais vapor d’água. Mais evaporação gera nuvens bem carregadas e, consequentemente fortes chuvas. “Sim, esse acordo foi pensado mundialmente para resolver problemas em todos os lugares e isso pode nos ajudar no cotidiano. Quem nunca ficou preso no trânsito, ilhado, por conta de uma chuva torrencial? Acordos ambientais podem nos ajudar neste sentido. Por isso é bom que a população crie consciência disso”. Ele completa dizendo que as mudanças climáticas por si só já deveriam fazer com que as pessoas compreendessem, “mas o brasileiro só toma ciência do que acontece quando o cotidiano dele é afetado”.

O Brasil tem metas bastante ousadas para cumprir, tanto que os índices bases para diminuição não são referentes a 2016, mas a 11 anos atrás. Isso mesmo, 2005. Em 2025, a meta é de diminuir 37% dos níveis bases. Em 2030, 43%. Para que isso seja alcançado, o Brasil se comprometeu a aumentar a obtenção de energia através de bioenergia sustentável, tornando-se 18% em 2030. Além disso, terá de reflorestar mais de 12 milhões de hectares de florestas.

Para se ter uma ideia das promessas em âmbito mundial, no ano de 2030 todos os países terão uma taxa de emissão de 42 gigatoneladas de CO² equivalente (todos os gases do efeito estufa, que são convertidos em dióxido de carbono). Se os países continuarem com as taxas atuais, o mundo alcançará com cerca de 55 gigatoneladas, que influenciam diretamente no aumento de temperatura.

Um dos maiores produtores de CO² no mundo é os Estados Unidos e o novo presidente do país, Donald Trump, que assume, de fato, o cargo no próximo ano, pensou em tirar os EUA do acordo, mas foi convencido que deve ficar pelo bem do próprio país.

O especialista em geopolítica Júlio Leal comenta que uma rebeldia do novo presidente poderia ser muito prejudicial ao projeto. “Como em qualquer questão que envolva assuntos com importância mundial, os EUA servem como uma espécie de parâmetro para balizar ações de outros países. Caso Donald Trump realmente retire o país do Acordo de Paris, outras nações podem sentir uma obrigação menor de honrar os termos do acordo”. Para Leal, se isso acontecesse, a China poderia se rebelar e não cumprir o combinado, chegando, assim, ao desastre ambiental.

O especialista acredita que o crédito carbono (venda de cotas de carbono para outros países, que utilizam mais do que o permitido) não prejudica o que foi definido em Paris. “Teremos que aguardar para ver a resolução na prática de tais questões, mas acredito na manutenção de tal mercado. Países desenvolvidos, utilizam de tal prática para poder seguir com suas práticas industriais e produções, tendo interesse na manutenção do conceito”.

Metas ousadas. Debates políticos aflorados. Negociações a todo tempo entre países. O Acordo de Paris ainda será muito falado nos próximos anos. Espera-se que positivamente.

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Mãos Limpas, mãe da Lava Jato, sofisticou a corrupção

 

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A Operação Mani Pulite (Mãos Limpas, em italiano), que inspirou a Lava Jato, foi responsável pela investigação de mais de 6 mil pessoas, entre elas quatro ex-primeiros-ministros, mudou o cenário político na Itália e sofisticou a rede de corrupção, segundo especialistas. 

Por Marcelo Rodrigues.

 

Há 24 anos, foi iniciada, em Milão, aquela que se tornaria a maior operação de todos os tempos contra a corrupção política e empresarial. A Operação Mani Pulite, ou Mãos Limpas, pode ser considerada a mãe de nossa Lava Jato.

Liderada pelo procurador Antonio Di Pietro, estremeceu as bases da Primeira República da Itália, alterou o sistema político do país, instaurado desde o período pós Segunda Guerra Mundial, e foi responsável pela extinção dos principais partidos políticos do país (entre eles, a Democracia Cristã – DC e o Partido Socialista Italiano – PSI). Coube à operação, também, a condenação de quatro ex-primeiros-ministros, 872 empresários, e 2993 mandados de prisão entre 6059 investigados. Entre os condenados, treze cometeram suicídio.

Assim como a Lava Jato, a operação Mãos Limpas começou por investigar a corrupção em níveis inferiores. O sistema judiciário já tinha conhecimento das redes de corrupção pelo país, mas não havia, até então, como aprofundar-se nesse meio. Em entrevista à revista Piauí, Antonio Di Pietro afirmou que a dificuldade consistia em “ir além do caso específico, e chegar ao sistema de financiamento dos partidos e conluio das empresas”.

Enquanto a Lava Jato iniciou suas investigações a partir de uma rede de postos de combustíveis utilizados para lavar dinheiro, na Itália, tudo começou com a denúncia de um pequeno empresário de que Mario Chiesa, líder do PSI (Partido Socialista Italiano) em Milão e administrador de um hospital da cidade, o extorquia, exigindo o pagamento de propina afim de obter licenças públicas.

A partir de uma investigação de corrupção a nível municipal, Di Pietro e o grupo de juízes e promotores de Milão conseguiram penetrar, cada vez mais fundo, no sistema nacional de corrupção entre empresário e partidos políticos.

Uma das principais ferramentas para coagir os envolvidos a entregarem detalhes das operações ilegais utilizada na Mãos Limpas foi a imprensa. Tal qual na Lava Jato, por meio de vazamentos seletivos para diversos veículos da grande mídia, os promotores e juízes pressionavam empresários e políticos.

O papel do jornalismo no caso italiano, explica Rossend Domenech, correspondente do jornal português “O Expresso”, na Itália, no entanto, se limitou a seguir o papel dos promotores. “O jornalismo italiano não é um jornalismo que ama muito denunciar casos que afetem os políticos”. O jornalista ainda afirma que o jornalismo investigativo italiano tem, por tradição, abordar mais as questões que envolvem as máfias.

As confissões de detidos que se sentiam traídos e abandonados por seus correligionários foram essenciais para o sucesso da operação. Tudo, graças ao papel da imprensa, que dava voz aos políticos envolvidos, ainda soltos, que tentavam limpar sua imagem e de seus partidos.

Limpeza geral ou nem tanto?

Após a queda de Bettino Craxi, primeiro-ministro socialista e tido como o principal operador dos esquemas de corrupção, afim de perpetuar a Democracia Cristã e seus aliados no poder – que ocupavam desde o pós-guerra – e do fim dos principais partidos italianos, entraram em cena, então, figurões de fora da política.

Mesmo com acusações, Silvio Berlusconi fundou seu próprio partido e ganhou as eleições de 1994. Domenech afirma que, à época, Berlusconi teria dito à imprensa que “já que estou sem padrinhos, entro eu para a política”. Uma das razões de seu sucesso nas eleições, foi a aprovação de seus três canais televisivos durante o governo de Craxi, seu aliado político.

Berlusconi iria, então, endurecer o combate contra a Mãos Limpas. Assim como observamos, após o impedimento da presidenta eleita Dilma Rousseff, seus sucessores mostrando-se preocupados com os rumos da operação Lava Jato e unindo esforços para barrar as investigações.

Segundo Domenech, a entrada de Berlusconi transformou a corrupção. Ele teria afirmado à polícia que “sonegar impostos pode ser legal, às vezes”. Em 19 de 20 acusações, foi absolvido graças a manobras políticas que reduziram o tempo de prescrição para crimes de corrupção, descriminalizaram a falsificação de balanços empresariais, por exemplo.

Para o cientista político italiano e professor na Universidade da Califórnia (UCLA), Raffaele Asquer, a estrutura das redes de corrupção da Itália foi aperfeiçoada. Agora, após o enfraquecimento dos partidos políticos, graças a Mãos Limpas, “a corrupção está mais descentralizada, local”, e “não são mais organizadas em torno das máquinas partidárias, mas sim dos burocratas, gestores de empresas estatais e privadas e chefes do crime organizado”, ressalta.

Domenech reforça a ideia de que a corrupção italiana atual é mais sofisticada e “distribuída capilarmente”. Segundo ele, isso se deve “porque o sistema financeiro, italiano e mundial, permite uma circulação mais fácil, rápida e anonimamente, do dinheiro, e porque (agora), os políticos e empresários aprenderam melhor”. O jornalista ainda traça um paralelo entre os sistemas judiciários italiano e brasileiro. Em ambos os países, “os magistrados têm, de fato, uma função de substituição da classe política, que não se autorregula eticamente”.

 

Além do modus operandi, as semelhanças entre Mani Pulite e Lava Jato tem se acentuado quando é analisada a postura da elite política e dos sucessores daqueles investigados. Manobras políticas e favores que beneficiam quem está envolvido nas denúncias de corrupção foram feitas durante e após as operações italianas, e já podem ser observadas no Brasil, passados dois anos desde o início da Lava Jato e poucas semanas após o impeachment de Dilma ter sido acolhido pelo Congresso brasileiro.

 

Ao fim da operação Mãos Limpas, menos de 25% dos investigados foram condenados, e apenas 2% chegaram a cumprir pena em regime fechado. Resta torcer para que, finalizada a Lava Jato, os números da operação brasileira sejam mais positivos, e a impunidade, combatida.

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O mundo dos serious games

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A partir de jogos de vídeo game,
estamos transformando a sociedade à nossa volta e a cara do aprendizado.

Por João Paulo Colisse

Uma afirmação que muitos de nós já ouviram, principalmente aqueles que são jogadores de vídeo game entusiastas “Vai estudar! ”, “Larga esse vídeo game e vai fazer algo da vida! ”, “Ficar jogando isso vai prejudicar seu cérebro! “. Acredito que muitos ouviram coisas assim e embora muitos de nós nos divertirmos muito com vídeo games a sociedade ainda os encara como um entretenimento, sem nada a acrescentar para a sociedade. Mas isso é verdade mesmo? Jogos de vídeo game não tem nada a acrescentar para nós?

Essas afirmações não poderiam estar mais distantes da realidade, embora a utilidade e os benefícios de diversos tipos de jogos ainda estejam abertos para debate e discussão existe um gênero de jogo que tem feito grande impacto no mercado e chamado igualmente a atenção de empresas e governos, esse gênero é conhecido como “Serious Games”, ou sendo traduzido do inglês “Jogos Sérios”.

Serious Games são definidos como sendo jogos criados com um propósito além do entretenimento, este propósito sendo o de transmitir algum tipo de conhecimento para a pessoa jogando.  Esses jogos não são tão populares quanto os jogos voltados para o entretenimento, mas eles têm ganhado espaço no setor empresarial por serem capazes de melhorar a capacidade de processamento de informação.

Serious Games em pro da aprendizagem

As pesquisas no campo ainda são recentes, mas de acordo com um artigo publicado na “Psychonomic Bulletin & Review” de 318 comparações entre 72 estudos, 95% deles mostrou um aumento nas capacidades de processamento de informação de seus grupos de teste, ou seja 71 dos experimentos e estudos mostraram que pessoas que jogam tinham um aumento médio de capacidade de processamento de informação.

Dr. Jan Cannon-Bowers, pesquisador na área de aprendizagem, fez diversas pesquisas diferentes tentar mensurar a efetividade dos jogos no aprendizado. Ele introduziu jogos para complementar cursos de diversos assuntos como economia, administração e negócios.

 

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México: um grito pelo respeito

O alto índice de casos de abusos sexuais no México mostra que, apesar dos anos, ainda vivemos em tempos arcaicos

Por Danielle Albuquerque e Thais Bugelli

A violência sexual no México é um crime recorrente. Estima-se que, entre os anos de 2010 a 2015, houve 1.414.672 de casos denunciados pelas mulheres, ou seja, sem contar os casos que ocorreram e não foram denunciados por medo e insegurança, tanto com relação ao agressor, quanto à justiça. Contando os casos não denunciados, o número duplica para 2.996.180, o que, de acordo com a Comissão de atenção as vítimas, significa 600.000 abusos por ano.

Um dos maiores problemas enfrentados por essas mulheres e também um dos motivos por elas não denunciarem e pelo número de abusos aumentar, é que a justiça não dá devida atenção ao problema. “O governo é parte do problema. Os feminicídos se produzem em escala tão grande como essa, pois o governo está, de alguma maneira, envolvido. Trata-se de uma violência do próprio sistema. E acredito que seja uma espécie de reação contra o feminismo e as maiores liberdades que as mulheres estão ganhando. O governo se preocupa mais que as mulheres ganhem liberdades do que as violentem e as matem”, conta Eli Bartra, filósofa e professora doutora em área Mulher, Identidade e Poder, do departamento de Política e Cultura da Universidade Autônoma Metropolitana na unidade de Xochimilco, no México.

Segundo dados da “Encuesta Naciona sobre la Dinámica de las Relaciones em lós Hogares” (ENDIREH), disponibilizados pela ONU Mulheres, de cada 100 mulheres com 15 anos ou mais, 63 já sofreram algum abuso ou violência ao longo de sua vida. E ainda, 27%  das mulheres com 15 anos ou mais, já foram vítimas de violência emocional, econômica, física ou sexual por parte de seu companheiro, e 15,5% por parte de um desconhecido, isso tudo somente no último ano.

Diante das cifras assustadoras, mulheres foram às ruas em várias cidades do país para mostrar sua indignação e horror e pedir às autoridades que tomem alguma providência contra os agressores e medidas para a prevenção desses ataques. A maioria das mulheres não possui acesso à justiça, e quando conseguem, a violação acaba passando pela justiça e os culpados, na maioria das vezes, não são declarados ou culpados ou nem são julgados. “A diferença que se observa entre as alegações e sentenças é a expressão mais alarmante da impunidade, de maneira que as mulheres além de não ter uma vida livre desse tipo de violência, não têm acesso à justiça ou reparações de danos sofridos”, declara a ONU Mulheres do México em relatório.

De acordo com Eli Bartra, as manifestações fazem o problema tornar-se mais visível a homens e mulheres, porém isso não vai fazer com que os atos de violências parem de uma hora para outra. “As manifestações são muito importantes porque dão mais visibilidade ao problema. Deixam claro que as mulheres e homens pedem por justiça, para que não haja mais feminicídio. Apenas isso, porém, não levará o assunto muito adiante. Uma manifestação, infelizmente, não vai parar a violência imediatamente, mas à longo prazo gostaria de acreditar que servem de algo”.

Sem poder contar com o apoio do governo para levar as denúncias de abuso adiante, muitas vítimas procuram ONGs que prestam serviços de acolhimento. A Asociación para el Desarrollo Integral de Personas Violadas (ADIVAC) prestam uma atenção psicológica, médica e legal a pessoas que vivenciam a violência sexual. Com palestras e textos informativos, a ADIVAC é uma das ONGs que tentam reeducar a sociedade e mostrar que o governo mexicano deveria dar mais atenção a um crime de número tão elevados no país.

Segundo um documento divulgado pelo governo mexicano e cedidos pela ADIVAC, assim como em diversas partes do mundo, o México possui uma sociedade que culpa a vítima pelo que aconteceu, a famosa cultura do estupro. Além disso, o chamado lenocínio, ato de intimidar alguém pelo prazer e descriminalização de certos grupos como crianças, migrantes, indígenas, pessoas com deficiências físicas ou mentais e até mesmo membros da comunidade LGBT se tornam alvo para quem pratica esse tipo de perversidade e são recorrentes no país. O documento também cita que 47,2% das pessoas enumeradas como vítimas são mulheres, e 21,4% são homens.

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Pesquisa aponta que 88% dos jovens brasileiros dormem mal

 

 

Por Ana Elisa Pachionni e Patrícia Mitsumoto

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Médicos alertam que uso de aparelhos celulares é um dos fatores que prejudica o sono

Isabella Salgado tem 17 anos e há pouco mais de um mês não consegue dormir direito. A jovem acorda diversas vezes durante a noite, demora para voltar a pegar no sono e no dia seguinte se sente cansada. “Atrapalha um pouco para estudar e prestar atenção”, afirma. Para tentar resolver o problema, Isabella tentou ir dormir mais cedo, tomar chá a noite, ficar sem assistir televisão e sem mexer no celular antes de se deitar, mas nada funcionou. Isabella acredita que este problema está relacionado com estresse, muitas horas de estudo e algumas mudanças que ocorreram em sua vida.

A Isabella, no entanto, não é a única nesta faixa etária que possui este tipo de problema. Segundo uma pesquisa realizada entre outubro de 2014 e janeiro de 2015 pelo Instituto de Pesquisa e Orientação da Mente (IPOM), 88% dos jovens brasileiros avaliaram o próprio sono como ruim ou insatisfatórios e declaram que possuem dificuldades para dormir. Dos 1830 jovens de 14 à 18 anos que participaram da análise, 47% afirmaram que acordam e dormem várias vezes ao longo da noite. Deles, 58% disseram que já acordam cansados e 94% repararam que ficam sonolentos ou possuem queda de rendimento ao longo do dia. Entre os motivos apontados pelos entrevistados para a insônia, 53% disseram ter perdido o sono por conta de preocupações com os estudos, enquanto outros 53% apontaram preocupações financeiras.

De acordo com a mesma pesquisa, 82% dos jovens dormem com o celular ligado ao lado da cama, 45% com a televisão e 22% com o computador. Segundo a pesquisadora do Instituto do Sono, Dalva Lucia Rollemberg Poyares, o jovem tem uma série de distrações e de opções de atividade antes de dormir, quanto mais interativa ela for, mais alteração pode causar no sono. Assim, quanto mais estimulado este jovem está, mais demorará a conseguir dormir.

Não é recomendável, portanto, utilizar aparelhos eletrônicos antes de se deitar. As ondas magnéticas emitidas por esses aparelhos parecem influenciar negativamente a função de vários órgãos, aponta a neurologista e especialista em Medicina do Sono Márcia Pradella-Hallinan. “Além de que o jovem aprende a identificar os sinais e mensagens recebidas e mesmo dormindo reage com pequenos despertares que não são conscientes, porém fragmentam o sono influenciando desse modo os processos fisiológicos associados ao sono”, explica.

Poyares apontou ainda que a privação do sono pode se tornar um problema crônico. “Uma noite mal dormida pode causar irritação, mal humor, depressão, o jovem pode ir mal na escola e até ter alterações comportamentais”, afirmou.

Há ainda outro fator que influencia nas noites de sono dos jovens: nesta idade, a pessoa tem uma tendência a dormir mais tarde. Segundo Poyares, isso é uma questão fisiológica. No Brasil, o horário de aula das crianças costuma iniciar um pouco mais tarde, por volta das 8h. Já nos colégios e nas universidades, tendem a começar mais cedo, cerca das 7h. A pesquisadora, no entanto, aponta que isso prejudica o jovem, já que ele “precisa acordar um pouco mais tarde”.

Se durante a semana o horário das aulas atrapalha no desenvolvimento adequado do sono, nos fins de semana, por sua vez, as atividades noturnas, como ir a balada, impedem que eles durmam melhor. “Os jovens tem a tendência de não compensar tanto o sono durante os fins de semana”, aponta Poyares, que ressalta que compensar não substitui uma noite mal dormida, mas ajuda a diminuir o atraso no sono.

Não são só os jovens que dormem mal

Dados de uma pesquisa desenvolvida pelo Instituto de Pesquisa e Orientação da Mente (IPOM) em dezembro de 2012 mostram que 69% dos brasileiros avaliam o seu sono como ruim e insatisfeito. Para esse resultado, foi avaliado cerca de duas mil pessoas, de 20 a 60 anos.

Além disso, a pesquisa avaliou que 82% deles sentem cansaço, sonolência e um pior rendimento ao realizar as atividades do dia posterior à noite mal dormida. Já 25% afirmam ter dificuldades em pegar no sono, 18% não dormem a noite inteira e 36% têm um sono inconstante, ou seja, dormem e acordam de hora em hora.

As principais causas dessas noites mal dormidas estão relacionadas com preocupações e problemas familiares e financeiros (50%) e estresse (40%). Entretanto, o problema do uso de tecnologia não implica apenas nos jovens, a pesquisa também apontou que 28% dos adultos brasileiros têm dificuldade de se desconectar dos estímulos eletrônicos, como celular, computador e televisão.

A neurologista e especialista em Medicina do Sono Márcia Pradella-Hallinan destaca que ter um sono ruim e desregular pode acarretar em alterações do humor e do comportamento, como irritabilidade, ansiedade, agressividade, dificuldade de se sociabilizar, timidez ou inquietude, sonolência diurna, dificuldade de concentração, atenção e aprendizado.

“A longo prazo estas dificuldades iniciais podem se acentuar chegando a ocorrer absenteísmo na escola ou trabalho [abandono de deveres], perda do ano escolar e aparecerem fatores físicos complicadores, como falta de energia e disposição para qualquer atividade física ou intelectual, desânimo, depressão, alterações gastrointestinais, obesidade, entre outros”, afirma Pradella-Hallinan.

 

Como ter uma boa noite de sono

Além de não ser adequado utilizar aparelhos eltrônicos antes de dormir, nem deixá-los ligados ao longo da noite, algumas práticas ajudam a ter uma noite melhor de sono. Segundo a neurologista e especialista em Medicina do Sono Márcia Pradella-Hallinan, o horário recomendável para os jovens brasileiros dormirem variam de oito a nove horas. Entretanto, existe jovens que necessitam dormir 11 horas. Pradella-Hallinan ainda afirma que isso não é considerado um problema de sono e sim uma necessidade aumentada.

Desfrutar de uma noite tranquila com oito horas de sono é essencial para Victor Petecof, de 24 anos, que afirma dar muita importância a isso. “Para mim uma noite mal dormida implica em passar um dia com a metade da disposição, velocidade de raciocínio e atenção”, explica o jovem.

“Ter um horário regular de sono é fundamental para que o organismo se habitue e aproveite das funções do sono”, afirma a neurologista. Pradella-Hallinan ainda destaca que o jovem támbém deve, na medida do possível, praticar atividade física sempre lembrando que o relógio biológico deve aprender a diferença entre o dia – atividades em um ambiente com luz – e a noite – repouso e ausência de luz. “A inversão desses parâmetros cria uma confusão cronológica no organismo que predispõem às dificuldades com o sono”, expõe. Além disso, ter uma alimentação saudável e evitar alimentos a base de cafeína durante a noite, que mantém a pessoa mais acordada, menos cansada e sem sono, pode ajudar.

De acordo com Victor, sua rotina para dormir implica em apagar todas as luzes do quarto, ler um livro ou assistir uma série até pegar no sono. Além de sempre tomar um copo de água antes de ir para cama e evitar comer comida pesada no jantar, como massa e carne vermelha.

Pradella-Hallinan ressalta que ter esse ritual ao dormir facilita o corpo a se preparar para o sono, como ler um livro com uma luz indireta de 40 watts situada na cabeceira da cama ou ouvir música com uma lâmpada azul de 8 watts no canto do quarto, podendo até auxiliar as pessoas que não conseguem dormir no escuro. “O ritual deve durar cerca de 20 minutos após o qual o jovem vai deitar e tentar adormecer. Isso favorece a liberação da Melatonina que é um neuro-hormônio que ajuda a conciliar o sono e precisa do escuro para ser liberada”, afirma a neurologista.

Sobre assistir televisão antes de dormir, a pesquisadora do Instituto do Sono Dalva Lucia Rollemberg Poyares afirma que isso “depende da pessoa”. “Se isso ajuda a pessoa a dormir, não é um problema”, explica. Porém, ela recomenda a programar o aparelho para desligar em meia hora, já que a luz e o som podem causar um pequeno despertar durante a noite.

Portanto, manter uma regularidade na hora de dormir e ter uma vida mais saudável é o caminho mais curto para aumentar o aproveitamento no sono.

 

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